02 março 2018

A CENSURA FASCISTA... (1)

A edição de 2 de Março de 1973 do Diário de Lisboa contém uma entrevista que é dada por Georges Marchais, então o secretário-geral do Partido Comunista Francês. Há até uma chamada de primeira página, embora se vivesse então sob o marcelismo, quando ainda vigorava a censura que entretanto só mudara de nome para a mais benigna designação de exame prévio. O pretexto para a realização da entrevista era a próxima realização de eleições legislativas naquele país, augurando-se com elas «a agonia do gaullismo». Não foi, mas isso é o que menos interessa. Sabendo o que se sabe hoje, sendo o autor da entrevista Urbano Tavares Rodrigues, militante fervorosamente comunista, também se adivinha que a entrevista (que ocupa quase toda uma página do jornal) não deve ter sido propriamente hostil para com o entrevistado... E, no entanto, os serviços da censura fascista tudo isto deixaram passar... Com esta evocação não se desculpa, muito menos se tenta legitimar, aquilo que aqueles serviços faziam, mas coloca-se a sua actuação num contexto factual, que muito frequentemente se esquece de ser referido por aqueles que alegam andar sempre muito preocupados em preservar a memória. Aqui temos o exemplo de um jornal de grande circulação de um país onde vigorava a censura fascista a publicar uma entrevista de um destacado dirigente comunista, ainda que estrangeiro. Mas ainda não encontrei exemplos de jornais de grande circulação de países onde, por sua vez, vigorava a censura comunista a acolherem reciprocamente nas suas páginas entrevistas a destacados dirigentes fascistas estrangeiros. Teria - terá? - sido possível que um jornal soviético, polaco, checo, pudesse publicar uma entrevista a Marcelo Caetano, por exemplo?...

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