07 junho 2016

AS «INDIGESTÕES» PROVOCADAS PELA «BOA IMPRENSA»

Há protagonistas que, mais do que as virtudes e predicados que indiscutivelmente possam possuir, o que mostram ter é uma imprensa que os incensa a ponto de os tornar indigeríveis. Ou pelo menos, eu não os consigo digerir. Apreciem estas duas capas da revista Time de 1974 com Henry Kissinger. Os 42 anos transcorridos reduzem-nas ao ridículo que merecem. Kissinger recebera no ano anterior um prémio Nobel da Paz por uma paz (no Vietname) para uma guerra que ainda não acabara. Simbólico e premonitório da sua insignificância, o negociador da parte contrária e co-premiado, o vietnamita Le Duc Tho, recusara o prémio. O Milagre no Médio Oriente propalado pela capa da direita, não evitara os profundos impactos económicos do primeiro choque petrolífero. Ter-se-ia que esperar mais cinco anos, um outro presidente e um outro secretário de Estado até à assinatura dos Acordos de Paz entre o Egipto e Israel em 1979. E o problema palestiniano ainda hoje permanece longe de qualquer solução milagrosa ou outra. Em suma, não deve ser só do desenho, aquele pombo da capa da esquerda faz-nos mais lembrar um pato que um pombo...
Paulo Portas não tem a importância, a visibilidade, a indulgência ou as pretensões a ser levado a sério como Henry Kissinger. É uma coisa à nossa escala, a que acresce o facto de ele gerar anticorpos que Kissinger não gera. Mas, mesmo assim, quando se resolve a trabalhar a comunicação social, a coisa tende a assemelhar-se. Se acima era a Time, abaixo aprecie-se o forcing temático que entre ontem e hoje o Observador dedica ao antigo director d'O Independente. Onde, para parafrasear Danny DeVito, ambos os textos são muito interessantes e algumas passagens até são rigorosas. Depois de lidos, a imagem que deixam de Portas é muito menos benigna do que os títulos acima sugerem. Mas isso também acontecia com os artigos que estavam dentro da Time a respeito de Kissinger... Por outro lado, o texto de que trata do eurocepticismo (premonitório?) de Portas, por exemplo, consegue contornar o facto de Paulo Portas estar inserido num partido a partir de 1995, o Partido Popular, que era dirigido por Manuel Monteiro e cuja imagem de marca era o eurocepticismo. Enfim, suspeito que pensará Paulo Portas (e eu concordarei), especialmente por se tratar do Observador, o que é importante é que falem bem de si, sobretudo se o detestarem...

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