18 maio 2016

AS CARTAS DESENCANTADAS DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL (1)

Há precisamente cem anos, o alemão Paul Hub de 25 anos, um dos voluntários que se apresentara em Agosto de 1914 para combater e que na ocasião frequentava um curso para promoção a oficial na cidade de Ulm, escrevia esta carta à sua noiva Maria Thumm:

Ulm, 18 de Maio de 1916
Querida Maria:
Como eu gostaria de te ter aqui comigo para que falássemos a respeito da tua comprida carta. Um casamento de guerra! Penso nisso tantas vezes. Cada hora que passa é uma hora de felicidade que se perdeu para sempre. Mas não devo pensar por agora em casamento porque não ganho ainda o suficiente.
E depois há a minha preocupações sobre poder ficar aleijado. Maria, tu dizes-me para não me preocupar com isso. Mas eu tenho que o fazer. Se ficares agarrada a mim, o que é que há de ser da tua vida? Eu sei que tu tudo sacrificarias por mim, assim como eu o faria por ti, mas o sacrifício seria demasiado.
Tens que me acreditar quando te digo que preferiria ter-te por minha mulher agora do que adiar para amanhã. Mas penso que nas presentes circunstâncias é demasiado precipitado. Não me leves a mal que eu responda à tua carta tão querida com estes pensamentos.
 
As preocupações de Paul Hub explicam-se depois de 21 meses de guerra e de esgotado o entusiasmo inicial que o arrebatara a ele, Paul, e aos dois irmãos, Otto e Robert, para a guerra. Os dois irmãos tinham morrido ambos, entretanto, na Frente Leste, enquanto Paul tinha sido incorporado no 247º Regimento de Infantaria de Reserva de Württemberg (a família era originária de Stetten-im-Remstal), unidade que se estreara em combate na Frente Ocidental na primeira Batalha de Ypres no Outono de 1914. Paul Hub tivera sorte e distinguira-se: recebera a Cruz de Ferro de 2ª Classe por feitos em combate. Mas nas trincheira parecia não haver sorte que sempre durasse: em 8 de Maio de 1915 Paul Hub foi ferido gravemente por estilhaços de shrapnel e teve que ser evacuado para um prolongado período de recuperação. Tornado um veterano por seis meses intensos de Frente, foi seleccionado para frequentar um curso de promoção. Não deixa de ser irónica a preocupação manifestada na carta quanto às possibilidades de ficar aleijado. Na verdade, por causa de uma acidente de infância, Paul Hub ficara com uma perna mais curta que outra e coxeava. Não se tivesse voluntariado e dificilmente teria sido mobilizado para as trincheiras. Daqui por três meses revê-lo-emos em acção já como oficial no Somme, onde os Aliados haviam lançado uma ofensiva. Estas cartas de 1916 de veteranos que regressam à guerra, que já sabem em que é que ela consiste, já perderam o entusiasmo dos primeiros meses de 1914, mas ainda lhes falta a saturação das cartas de 1918.

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