05 fevereiro 2016

SOBRE A RACIONALIDADE DOS GRANDES ACTORES ESTRATÉGICOS

Christopher Frederick Ashton Warner (1895-1956), uma figura completamente desconhecida da burocracia do Foreign Office (Negócios Estrangeiros) britânico no período da e do pós (Segunda) Guerra (Mundial). Terá sido uma pessoa importante sem que os leigos se apercebessem da sua importância com a discreta função de subsecretário de Estado adjunto durante a vigência do governo trabalhista (1945-51), com a sua carreira diplomática a vir a ser coroada posteriormente com a colocação como embaixador em Bruxelas (1951-55). Christopher Warner é um exemplar típico da esquerda trabalhista britânica (de que o exemplo mais visível foi Ernest Bevin) que não tinha quaisquer complexos em criticar e demarcar-se do comunismo. Mas o que aqui quero destacar é a qualidade e a presciência de uma das suas análises elaborada ainda durante o período de Guerra, num documento apresentado em Fevereiro de 1944 (quatro meses antes do Desembarque na Normandia...), e que tinha por tópico o que poderiam vir a ser as intenções estratégicas da União Soviética depois do fim do conflito que então se travava.

Para Warner, as intenções de Estaline em termos de política externa ir-se-iam manter precisamente as mesmas que haviam sido adoptadas na sequência da eliminação do seu rival Trotsky no México em Agosto de 1940, quando o problema de quaisquer disputas sobre a supremacia ideológica dentro do movimento comunista internacional se deixara de colocar. A missão concentrar-se-ia na procura de garantir a segurança contra qualquer Potência ou associação de Potências que pudessem ameaçar a União Soviética enquanto ela estivesse a organizar e desenvolver o seu vastíssimo território. Nesse sentido e na perspectiva britânica, Warner consideraria os soviéticos inimigos improváveis a prazo a não ser que os soviéticos pudessem interpretar intenções hostis da parte do Reino Unido contra a sua segurança. Seria quase seguro que, depois da Guerra, os russos iriam tratar a Alemanha com a maior brutalidade e mostrar-se-iam permanentemente atentos a quaisquer possibilidades de manobras que melhorassem as suas posições no resto da Europa, manobras que aumentassem a sua influência sobre todos os restantes países europeus, quer por manobras ostensivamente políticas com a parceria de governos da esquerda e extrema esquerda que lhes era simpática, quer interferindo de forma menos clara, através da intriga política de bastidores ou mesmo de ameaças discretas do exercício da força, quando a ameaça fosse credível. Fora da Europa, este seria também o género de comportamento a esperar dos soviéticos. Até aqui, Warner e o seu documento iam a caminho de fazer um treze no Totobola...

Mas não chegou ao prémio de totalista. A sua última previsão era sobre as prioridades com que a União Soviética se defrontaria no término da Guerra. E aí a racionalidade com que Warner estava a configurar os seus cenários prováveis não se conseguiu encaixar com a tortuosidade das desconfianças de Estaline. Para Warner a recuperação da enorme destruição que os territórios ocidentais da União Soviética haviam sofrido com a invasão alemã dever-se-ia sobrepor a todo um outro conjunto de prioridades fora do seus espaço e, para a concretizar, o analista britânico antecipava um período inicial de uns cinco anos em que seria do interesse soviético voltar-se para a recuperação interna e mostrar-se relutantemente cooperante com o sistema de segurança internacional das Nações Unidas, que era a menina dos olhos de Roosevelt e dos norte-americanos. A história da ONU veio a revelar-se, porém, uma história de concorrência e conflitualidade desde os primórdios. Em 1948, os anglo-saxónicos estavam a reabastecer Berlim por via aérea, em 1949 estavam a fundar a NATO.

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