22 fevereiro 2016

58º ANIVERSÁRIO DE UM PROJECTO ROTUNDAMENTE FALHADO

Em 22 de Fevereiro de 1958 os presidentes Gamal Abdel Nasser do Egipto e Shukri al-Quwatli da Síria assinavam o acordo para a fusão dos dois países que daria origem ao nascimento da República Árabe Unida. Paradoxalmente, a iniciativa partira da Síria, onde, espantemo-nos, naquela época e ao contrário do Egipto, até havia uma opinião pública e eleições com um grau mínimo de liberdade. Era essa opinião pública que, entusiasmada com a projecção da imagem de Nasser no mundo árabe após a guerra do Suez, empurrava as elites políticas sírias para uma associação com o Egipto. A situação deu margem de manobra para que Nasser pudesse impor as suas condições para a fusão. A República que nascia decalcava quase todas as suas instituições das egípcias, a começar pelo monopartidarismo, que era estranho às tradições políticas sírias¹. Contudo, os dados dos referendos que, realizados no dia anterior (21 de Fevereiro), validavam a assinatura dos dois presidentes, eram indicativos do que se poderia esperar, a prazo, daquela unidade. Não por causa dos resultados, que eram, como seria de esperar, entusiásticos no seu unanimismo pela fusão, mas pelos 1.313.000 eleitores da Síria quando comparados com os 6.104.000 do Egipto.
Sem contrapartidas de segurança, conhecidas as condições desequilibradas em que o acordo fora firmado, o ascendente do presidente egípcio e o facto de, demograficamente, haver seis egípcios por cada sírio, antecipava-se que o processo não tardaria a degenerar, como degenerou, num descarado Anschluß (do nome da anexação da Áustria pela Alemanha em 1938). Variados exemplos do tratamento subordinado dado à Síria e aos sírios podem ser lidos na Wikipedia. Um caso que se veio a revelar importante foi o das forças armadas sírias, que Nasser tentou mas não conseguiu controlar com a nomeação de comandantes egípcios e sírios que lhe fossem leais. Três anos e meio depois das ilusões, quando, entre outras medidas, se quis introduzir a união monetária entre os dois países, a situação política na Síria já degenerara tanto que em Setembro de 1961 um grupo de oficiais do exército sírio deu um golpe de estado que não teve quase nenhuma oposição. Uma ideia de união que fracassou porque as sociedades árabes haviam evoluído muito e já não se viviam anos em que um projecto daquela envergadura se podia efectuar à volta da figura, ainda que carismática, de uma espécie de califa laico.
¹ Para além das tradições históricas distintas dos dois países, até no seu passado colonial, o Egipto fora um protectorado britânico (1882-1952) enquanto a Síria fora um mandato francês (1919-1946).

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