20 julho 2015

DOS FRACOS NÃO REZA A HISTÓRIA

De entre os muitos milhares de protagonistas da Segunda Guerra Mundial, Dirk de Geer (1870-1960) contar-se-á por um dos mais modestos, apesar de ter sido o primeiro-ministro holandês entre Agosto de 1939 e Maio de 1940 em Haia e ainda por mais três meses e meio no exílio em Londres, até princípios de Setembro de 1940. Durante esse período – durante o qual se registou a invasão e ocupação alemã do seu país – sobraçou também as pastas das Finanças e do Interior. Contudo, para o desfecho que a Segunda Guerra Mundial e para a imagem que os Países Baixos pretendem transmitir para o Mundo da sua participação e do seu sofrimento durante ela, Dirk de Geer revelou-se o homem errado, no cargo errado, no momento errado. De Geer era um germanófilo. Passava as suas férias frequentemente na Alemanha e fê-lo ainda uma vez já depois da eclosão da Segunda Guerra Mundial. Em verdade, mantendo as rotinas de sempre apesar da guerra, a sua atitude reflectia muito mais as expectativas do holandês médio: as de que o seu país escaparia às vicissitudes do conflito. A outra facção, minoritária entre a opinião pública, é que era a agourenta. Mas provou ter razão quando da invasão em Maio de 1940 e é sob o seu elan que é decidida a evacuação do governo e da família real para o Reino Unido. Porém, a convicção profunda do chefe do governo manteve-se: que a guerra nunca poderia ser vencida pelos seus novos anfitriões e defendendo por isso que se procedessem realisticamente a negociações com a Alemanha para que se arranjasse um novo modo de vida com o vencedor. Sob pressão britânica, houve uma remodelação ministerial, e o primeiro-ministro de Geer foi substituído à frente do executivo no exílio por Pieter Gerbrandy (1885-1961), que permaneceu nessas funções até depois do fim da guerra (1940-45).
Restava saber o que fazer com de Geer, que andava a pensar novamente em tirar férias – embora, devido às novas circunstâncias, pensasse agora na Suíça neutral como destino... Seguindo um exemplo que vingara com o antigo rei Eduardo VIII¹, ofereceu-se-lhe um cargo administrativo prestigiado na maior colónia holandesa, a das Índias Orientais, actual Indonésia. De Geer fingiu aceitar mas, ao chegar a Lisboa, primeira escala neutral do périplo para o levar para o outro lado do Mundo, entrou em contacto com os alemães que o autorizaram a regressar aos Países Baixos. Esta deserção daquele que fora até há pouco o chefe do governo holandês foi um tremendo golpe de propaganda para a causa germanófila nos Países Baixos, complementado ainda com a publicação de um panfleto da autoria do regressado com instruções quanto à melhor maneira de colaborar com os ocupantes. As suas convicções tê-lo-ão feito alinhar com o lado errado da História e de Geer veio a ser julgado e condenado por traição em 1947, condenado a um ano de prisão mais três anos de pena suspensa, uma pena assaz benigna quando comparada com as aplicadas a chefes de governo colaboracionistas de outros países: Pierre Laval (1883-1945) em França ou Vidkun Quisling (1887-1945) na Noruega foram fuzilados, Georgios Tsolakoglou (1886-1948) na Grécia viu a sua condenação à morte comutada em prisão perpétua. Dirk de Geer morreu em 1960, em vésperas de se tornar nonagenário, amargurado pela injustiça que considerava que lhe haviam feito e no meio de uma discrição tácita que conquistara a sociedade holandesa quanto aos comportamentos desviantes durante o quinquénio da ocupação alemã. Só mais recentemente – os dois livros acima são de 2012 e 2014 – o tema, de Geer em particular, tem voltado a ser falado.

¹ Conotado de simpatias para com o nazismo e arremessado pelas operações militares para Lisboa, onde se encontrava desde Julho de 1940, decidiu-se em Londres enviar o Duque de Windsor directamente daqui para as Bahamas, para se tornar no governador daquele arquipélago das Antilhas que o próprio qualificou como uma colónia de terceira classe. Ali permaneceu até quase ao fim da guerra (1940-45).

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