05 fevereiro 2015

«YO NO SOY UNA TRAPACERA»

A presidente argentina Cristina Kirchner conseguiu o feito de ser objecto de duas notícias de projecção internacional quase simultâneas. Numa delas, há um escândalo em curso, em que um procurador que andava a investigar um assunto incómodo para a presidente foi encontrado morto, dado por suicidado, corrigido depois para assassinado – e o caso agravou-se porque houve um jornal que noticiou que se encontrou documentação indiciando que o procurador que foi ajudado a suicidar-se se disporia a emitir um mandato de detenção contra a presidente. E é em cima de uma notícia com esta gravidade que aparece a outra, que nos querem fazer crer merecedora de tanta ou mais atenção que a anterior: em visita oficial à China, o assessor de Kirchner encarregado de tuitar os pensamentos presidenciais¹ do dia resolveu ser engraçado e fazer um trocadilho com a pronúncia chinesa, trocando os erres pelos eles – o gesto foi trazido para as primeiras páginas dos jornais argentinos criticando a infelicidade do gesto da presidente. Visto a esta distância, a pretensa xenofobia de Kirchner parece não passar de um exemplo canónico daqueles casos artificialmente empolados (e mesmo críticos desde que sirvam) para abafar mediaticamente um outro que verdadeiramente incomoda. Com indícios destes, o caso do assassinato do procurador Alberto Nisman promete cada vez mais vir a tornar-se escabrosamente interessante, numa saudável demonstração, quiçá, que as mulheres também não estão imunes às tentações de escroquerias presidenciais.

¹ Só os ingénuos imaginam que são os presidentes a fazê-lo pessoalmente. No caso português é preciso mesmo que a ingenuidade se mescle de alguma dose de estupidez: Cavaco Silva a tuitar?...

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