25 março 2014

A CHUVA QUE NÃO MOLHA MALTA

Malta é um dos nossos parceiros da União Europeia. Imaginem que a Madeira se tinha tornado independente e com ela teremos uma boa base retocável para descrever Malta. Transferindo-a das franjas do Atlântico para o centro do Mediterrâneo (acima), reduzindo-a nas dimensões (abaixo – a ilha da Madeira tem 740 km², o conjunto das ilhas de Malta 316 km²) e alterando-lhe a morfologia: a Madeira é de formação vulcânica, Malta, com os seus terrenos calcários, de formação sedimentar. Porém Malta, com mais de 400.000 habitantes, tem uma população que é cerca de 50% superior à da Madeira, uma das maiores densidades populacionais da Europa. Climas semelhantes, o turismo é uma actividade fundamental para a economia de ambas. Mas, para terminar, complementarmente a esta comparação e tendo em conta o que são tradicionalmente as prestações desportivas da selecção maltesa de futebol, imagine-se a tragédia futebolística que não seria a independência da Madeira: é que não afectaria apenas a selecção portuguesa lesada com o desaparecimento do seu mago Cristiano Ronaldo; afectaria também o rendimento deste último se acompanhado pelos dez coxos que lhe caberia como companheiros de selecção.
Mas embora situados ambos na zona de fronteira entre Europa e África, e reconhecendo-se pertencentes à primeira, a história dos dois arquipélagos ilhas é totalmente distinta, a começar logo pelo povoamento, pré-histórico no caso de Malta, iniciado apenas a partir do Século XV no caso madeirense. A Madeira foi sempre portuguesa enquanto Malta, mesmo contando apenas a sua história depois do Século XV, foi aragonesa, depois passou a ser administrada pela Ordem dos Hospitalários (1530), de seguida francesa (1798), depois britânica (1800), até se tornar independente em 1964. Apesar de Malta, por causa da sua localização geográfica, se ter preocupado em adoptar uma política de neutralidade durante o período da Guerra-Fria, quando esta acabou procedeu a uma inflexão, fazendo o seu pedido de admissão à União Europeia (1990). A admissão veio a ter lugar em 2004 e em 2008 integrou-se na zona Euro. Malta está localizada na periferia da União, não tem nesta aliados poderosos, não foi um país importante no xadrez do processo de alargamento que teve lugar a partir de 1989 mas, por outro lado, pela sua pequena dimensão, também nunca foi um país propenso a despertar antipatias.
Há cerca de um ano, no seguimento da crise financeira de Chipre, surgiram rumores que algo de muito semelhante ao que se estava a passar com a banca cipriota poderia vir a acontecer com Malta – rumores que foram rapidamente desmentidos. Não impediu que alguns meses depois as agências de notação tivessem discretamente revisto em baixa a classificação atribuída àquele país. É que sempre se pode explicar o quanto se considera que a banca maltesa (ao contrário da cipriota, da irlandesa, da islandesa, etc.) está sólida mas os factos mostram, até aos leigos, que existe um potencial problema congénito: os balanços agregados dos bancos malteses representam cerca de 800% do PIB da Malta. Assim, a solução adoptada tem sido passar mediaticamente desapercebido, o que em linguagem coloquial costumamos designar por passar entre os pingos da chuva. Malta tem a (falta de) dimensão para conseguir isso, assim como – reconheça-se – Alberto João Jardim também o está a conseguir fazer na Madeira. Depois do conceito económico do too big to fail (demasiado grande para falir), descobre-se o conceito oposto do too small to bother (demasiado pequeno para incomodar). Azar o de Portugal, ser um país de dimensão intermédia… 

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