26 janeiro 2014

REFLEXÕES ESCRUTINADAS SOBRE A ACTUAL REPRESENTATIVIDADE DOS PARTIDOS POLÍTICOS

Pedro Passos Coelho foi Sábado à noite reeleito presidente do PSD “com 15.524 votos, quando faltavam apurar 32 secções", o que representaria "cerca de 88 por cento dos votos”, de um universo de 46.430 eleitores, em que votaram 17.662 (militantes) sociais-democratas. (da comunicação social)

Recorde-se, para comparação, que nas últimas eleições legislativas, o cabeça de lista do Partido pelos Animais e pela Natureza (PAN) pelo círculo de Lisboa, Paulo Alexandre Esteves Borges, não conseguiu ser eleito deputado, mesmo que a lista que encabeçava tivesse recebido então 16.913 votos. Donde se conclui que a votação nacional agora averbada ao primeiro-ministro nas eleições internas do seu partido não lhe asseguraria sequer, num contexto de eleições legislativas, um lugar no parlamento¹.

Embora se possa sempre alegar que as duas votações não são de natureza escrupulosamente semelhante, a conclusão que se pode extrair destes números é, como se escrevia no título de um artigo de opinião saído há cerca de um ano no Público, que Mais de 99% dos portugueses nunca votaram nas eleições para escolha dos candidatos a primeiro-ministro (directas do PS ou PSD). A maioria provavelmente não quererá, mas mesmo quem o queira não pode, a não ser que se disponha a filiar num daqueles partidos.

Uma das formas como se procura condicionar o debate sobre este tema da representatividade das nossas organizações políticas é começar por estabelecer quase em jeito de axioma aquele estafado lugar-comum que diz os partidos políticos são indispensáveis para a democracia. A montante de qualquer debate sério sobre o seu conteúdo esta frase tem a virtude (para os que defendem este status quo) de conseguir deslocar de antemão o cerne do problema, confundindo e associando sem distinção os meios (os partidos) e os fins (a Democracia).

Essa confusão parece patente na hierarquia das duas soluções apresentadas pelo artigo de opinião mencionado acima: 1) A entrada da sociedade civil nos nossos principais partidos, como militantes de pleno direito para votarem e se candidatarem nas suas eleições internas; 2) Abrir as eleições directas partidárias para escolha da liderança a todos os simpatizantes e eleitores do partido (…). Como Maomé e a montanha, com a primeira solução visivelmente esgotada e a montanha inamovível, terá que ser Maomé e os partidos a mexerem-se, abrindo as suas eleições internas.

Vale a pena perceber e comparar o que pode ser o envolvimento popular nesses processos de eleições partidárias internas abertas, um processo que já foi adoptado, por exemplo, pelo Partido Socialista Francês nas últimas eleições presidenciais, mas de que os grandes pioneiros terão sido os norte-americanos, quando se inaugurou a tradição (que, saliente-se, ainda não tem 50 anos…) de realizar eleições primárias entre os activistas e os simpatizantes para a selecção do candidato presidencial.

Numas eleições primárias disputadas, como foram as de 2008, o total de eleitores envolvidos pôde atingir 19,1 milhões entre os democratas (mais 13,1 entre os republicanos), o que será o equivalente a 6% (e 4%) de toda a população norte-americana. Também os 2,9 milhões de participantes nas primárias francesas de Outubro de 2011 dão-nos uma taxa de participação próxima quando comparada com a população: 4,5%. Mas não será justo comparar eleições disputadas como estas foram com reconduções de desfecho previsível.

Tanto como a reeleição de Pedro Passos Coelho, também as primárias democratas de 2012 foram um passeio para o presidente Barack Obama. Dá-se até a coincidência de, em votação popular, os 89% dos votos recolhidos por Obama no final se aproximarem dos 88% de Passos Coelho. A diferença é que, mesmo em eleições tépidas, a recandidatura presidencial de Barack Obama foi legitimada por mais de 6 milhões de votos populares (2% da população) o que em Portugal corresponderia a uns 200 mil votos…e Passos Coelho recebeu um pouco mais de 15 mil.

¹ Os 23.903 votos averbados, por sua vez, a António José Seguro nas eleições internas do PS em 2011 assegurar-lhe-iam esse lugar e só esse, o que me faz supor que o panorama possa não se apresentar substancialmente melhor apesar disso, para quem se propõe liderar bancadas parlamentares constituídas por uma centena de deputados.

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