22 agosto 2011

«PICANTÉ? NÔÔ PICANTÉ!»

O aspecto mais pitoresco do restaurante indiano que frequentava quando estava de férias na Praia da Rocha era, não a comida, mas o empregado que nos atendia. A comida que ali serviam não era notável, a não ser por, fossem quais fossem as indicações que o cliente havia dado previamente quanto à intensidade do picante no prato que escolhera, ele vinha sempre igualmente picante. Tudo era picante, até a salada!

Ensinaram-me entendidos que conheceram a Índia profunda que nunca se deve investigar muito o que acontece numa cozinha indiana tradicional para benefício da nossa digestão… Eu tornei o princípio também válido para os restaurantes indianos em Portugal mas há quem não siga essa sábia recomendação e chamasse o empregado para reclamar. Aí é que começava a sessão que tornava o local pitoresco
O empregado aproximava-se e, fingindo não dominar bem o português (calhou vê-lo a fazer a mesma cena em inglês com um turista), suportava estoicamente e com ar atencioso a invectiva irritada do cliente até este perder o fôlego (provavelmente por ter a língua a arder!...) quando, afivelando o seu sorriso mais bonacheirão retorquia: Picanté? Nôô picanté! Estabelecia-se ali uma barreira mais do que linguística, antropológica!

Creio que a política portuguesa está a precisar de alguém com uma atitude semelhante para mediar as relações entre o governo nacional e os regionais, nomeadamente o da Madeira. Num último desenvolvimento, aproveitando o jornalismo que existe e que tanto censura mas que manipula como poucos políticos, Alberto João Jardim aproveitou um evento do seu partido para pedir mais dinheiro emprestado…

Desta vez chamou-lhe liquidez… E a informação aceita o seu estilo de tal forma que é preciso vasculhar jornal atrás de jornal para encontrar alguém que escreva ou diga o que é óbvio: a) que mandar recados em comícios não é a forma apropriada de resolver problemas de finanças públicas. b) que o partido a que o primeiro-ministro preside não concorre às próximas eleições regionais madeirenses.

Quem concorrerá é uma outra organização que obedece a (porque depende de) Alberto João Jardim, que por acaso usa a mesma sigla. Que tem uma agenda muito pouco solidária para com os sacrifícios dos continentais e que não tem pejo em o mostrar. É aqui que, em vez de recados nos jornais, deve entrar o equivalente do empregado indiano, toda uma outra antropologia a responder de sorriso bonacheirão a Jardim: Liquidéz? Nôô liquidéz!

Sem comentários:

Enviar um comentário