09 outubro 2009

GABRIELA, CANA E BANANA*

Lamento, mas quem quiser perceber melhor o conteúdo deste poste tem que ter uns conhecimentos, ainda que vagos, do enredo da obra Gabriela, Cravo e Canela, um livro de Jorge Amado de 1958, que foi popularizado entre nós através de uma transposição para uma telenovela realizada pela TV Globo em 1975 e que passou em Portugal com um enorme sucesso em 1977. A acção decorria na cidade baiana de Ilhéus, nos anos vinte do século passado, e a história de fundo é a da transição geracional de poder entre a classe dos latifundiários, dirigida pelo velho Coronel Ramiro Bastos, e a dos grandes comerciantes de cacau, dirigida pelo ambicioso Dr. Mundinho Falcão.
Numa das peripécias da telenovela, no funeral de um dentista (Dr. Osmundo) que fora assassinado por um coronel (Jesuíno) que o descobrira em adultério flagrante com a mulher (Dona Sinhazinha), houve um momento de enorme tensão, com jagunços de arma apontada aos manifestantes, quando o Dr. Mundinho e a opozeção desenrolaram uma faixa com os dizeres cobardemente assassinado. Ora, ao ver um dos filmes que o PND colocou no You Tube (acima), a estragar uma das cerimónias de inauguração de Alberto João Jardim com os seus cartazes e, sobretudo, ao ver a reacção de desagrado deste último, lembrei-me automaticamente da cena e dos coronéis de Ilhéus.
A reacção de Jardim, conjuntamente com trinta anos de fiascos sucessivos no passado, mostram que a forma de fazer oposição praticada pelo PND na Madeira parece ser mais eficaz que todas as outras. Na Madeira, a disputa política ainda não chegou à fase da insurreição armada (como a que o PAIGC alega ter sido obrigado a fazer, depois de Salazar não ter respondido a uma carta de Amílcar Cabral sobre a auto-determinação da Guiné e Cabo Verde...), mas certamente estar-se-á a meio caminho entre a subversão armada e uma democracia normal. Será a subversão… desarmada! E as autoridades (acima e abaixo) tendem a reagir em conformidade, se bem que nem sempre na legalidade...
Entretanto, em Portugal Jardim deve gozar de uma popularidade idêntica à de Bush: se alguém, um destes dias, se lembrar de também lhe atirar um par de sapatos suspeito que a maioria vai ficar com pena... de quem ficou descalço. Mas até Jardim não nos pode irritar para sempre... Escolhi para o fim (abaixo) as cenas do último capítulo da telenovela em que aparece o Dr. Mundinho já promovido a novo senhor de Ilhéus. Se alguma coisa estes percalços podem antecipar é a afirmação do potencial sucessor de Jardim na pessoa do líder local do PND, Baltazar Aguiar, em detrimento das segundas figuras do PSD local como Jaime Ramos ou Guilherme Silva, tão broncos como qualquer coronel do cacau
* A cana-de-açúcar e a banana são dois dos produtos agrícolas mais emblemáticos da Madeira.

4 comentários:

  1. Excelente.
    A propósito, já reparou que na "Fazenda" do coronel Jardim, nunca aparecem "Gabrielas"?
    Aquilo é mesmo terra de machos (que é como quem diz...)ou então misóginos.

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  2. E então a Fátima Lopes?

    Eu bem sei que não se compara à Sónia Braga, mas mesmo assim...

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  3. A propósito, eu não realcei isso no poste mas entre as conspirações em Ilhéus (3º vídeo) e o resultado dessas conspirações no Funchal (4º vídeo) há uma diferença interessante:

    Enquanto o Coronel Melk Tavares se sente à vontade para utilizar os seus policiais (que dificilmente se distinguem dos seus jagunços);

    o coronel do Funchal teve de recorrer a uma empresa de segurança privada (SECURITAS) para implementar uma medida da mais duvidosa legalidade: a de tranformar uma cerimónia pública numa via pública numa cerimónia "selectivamente" privada...

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  4. Tem razão. E, já agora, também temos a mãe e a irmã (que canta) do CR e ainda aquela senhora que frita as bifanas no Chão da Lagoa e costuma aparecer na tv.

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