24 junho 2009

UMA RECAPITULAÇÃO DOS RESULTADOS DAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS IRANIANAS

Foi só depois da a abolição da monarquia em 1979 (abolida num referendo realizado em 31 de Março de 1979) que se criou a posição de Presidente no Irão. Apesar de parecer uma figura grada do Estado Islâmico, legitimada pelo voto popular, os acontecimentos associados aos dois primeiros ocupantes do cargo mostraram que a realidade política iraniana e os seus intervenientes não ligavam nada a essas bagatelas do que, entre nós ocidentais, seria interpretado como a expressão da vontade popular.
Assim, o primeiro presidente iraniano foi (acima) Abol Hassan Bani-Sadr (n. 1933), eleito em 25 de Janeiro de 1980 com uma maioria esmagadora de 78,9% dos votos populares. Votos esses que, mesmo se tiverem sido legítimos, de nada lhe valeram quando entrou em choque com o o Ayatollah Khomeini (1902-1989), que era o verdadeiro líder do Irão: foi deposto pelo Parlamento iraniano (Majlis) em 21 de Junho de 1981 numa votação de 177 votos a favor contra 1... Bani-Sadr havia-se exilado em Paris e marcaram-se novas eleições.
A 24 de Julho de 1981, a maioria de votos populares que elegeram Mohammad Ali Rajai (acima, 1933-1981) foi ainda mais impressionante que a anterior: 88,1%. O mandato de Ali Rajai também foi encurtado por quem não se impressionava com tais manifestações de apoio popular, embora tivesse exprimido essa indiferença de uma maneira um pouco distinta da do Ayatollah Khomeini: foi através de uma pasta armadilhada com uma bomba que foi plantada na Sala de Reuniões presidencial, matando-o a 30 de Agosto de 1981…
Tornando-se uma profissão de desgaste rápido, impunha-se que o próximo presidente fosse eleito ainda com mais apoio popular. De facto, Ali Khamenei (acima, n. 1939), foi eleito em 2 de Outubro de 1981 com 96% dos votos! Uma quase unanimidade! Depois, as coisas acalmaram e Khamenei foi reeleito em 16 de Agosto de 1985 com apenas 85,6% dos votos. Datam destes tempos de acalmia, o período em que o actual candidato contestatário, Hussein Mousavi (a última fotografia do poste, n.1941) era Primeiro-Ministro.
Mousavi terá sido um dos sacrificados na transição que se verificou em 1989. Khamenei não se podia recandidatar e nas eleições presidenciais de 28 de Julho desse ano o vencedor foi Hashemi Rafsanjani (acima, n.1934) com uns imponentes 94,5% dos votos. Nas eleições seguintes, que tiveram lugar em 13 de Junho de 1993, foi a primeira vez que os resultados eleitorais assumiram leves contornos de disputa: Rafsanjani venceu-as com 63,2% dos votos versus um candidato conservador (Ahmad Tavakkoli) que atingiu os 24%!
A necessidade da apresentação de maiorias quase unânimes parece ter-se perdido depois das eleições de 1993 e nas de 1997 (a 3 de Julho), apesar de se tratar da eleição de um novo Presidente (a Constituição iraniana limita o número de mandatos consecutivos a dois) Mohammad Khatami (acima, n. 1943) foi eleito para o cargo apenas com 69,1% dos votos. Em contrapartida, a sua reeleição, que teve lugar em 8 de Junho de 2001, teve um resultado mais substantivo, vencendo com 78,3% dos votos.
As eleições presidenciais iranianas de Junho de 2005 foram as primeiras – e, até agora, as únicas – a mostrar alguma animação. Foi necessária uma segunda volta, porque os resultados da primeira, que teve lugar a 17 de Junho de 2005, produziram resultados muito cerrados, com cinco candidatos a pulverizarem a votação entre si: o vencedor, o ex-Presidente (1989-97) Rafsanjani recebeu 21,1% dos votos, enquanto os seus rivais receberam, respectivamente, 19,4%, 17,2%. 13,9% e 13,9% da votação.
De acordo com a Constituição, os dois candidatos mais votados passaram à segunda volta e nela, a 24 de Junho, foi o segundo candidato, Mahmoud Ahmadinejad (penúltima fotografia, n. 1956) a vencer, recebendo 61,7% da votação versus os 35,9% recebidos por Rafsanjani. Visto desta forma encadeada, percebe-se como as eleições de 2005 foram uma anomalia e como as expectativas que já se pudesse dar por adquirido que as eleições presidenciais iranianas de Junho de 2009 pudessem ser transparentes, foram claramente prematuras…

6 comentários:

  1. Mais um inestimável trabalho do A. Teixeira. Nao poupo no elogio porque nao receio que se envaideça - nem o julgador tem o mérito nem o julgado tem a fraqueza intelectual necessárias.

    Mas aviso já que anda por aí uma moda entre bloguistas, de se "elegerem" uns aos outros, e o caro A. Teixeira corre riscos de ser apanhado na rede se alguém conceder em fazer uma avaliaçao séria do "mercado".

    (Desculpem a falta de tiles e acentos circunflexos - sao as condiçoes de trabalho que tenho. Aceito ajuda).

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  2. Que eu tenha dado por isso já fui "apanhado" nessa rede de que fala: aqui, em http://defenderoquadrado.blogs.sapo.pt/490426.html.

    Quanto ao seu problema, sem mais descrições, pode ter origens distintas: desde a configuração do teclado até a um mau contacto da tecla - a da 3ª fila imediatamente à esquerda da ENTER.

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  3. Não penso que a minha opinião conto muito mas há muito que consulto com deleite este blogue, que considero um dos meu eleitos (ou mesmo o eleito).
    António, o "mercado" tem destas coisas e permite que seja o "o povo quem mais ordena".

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  4. As regras do mercado fazem com que o número de visitantes deste blogue seja uma fracção da de muitos outros que são bem mais populares, João Moutinho.

    Há a qualidade como que se escreve, o tema sobre o qual se escreve, e também a construção de uma rede de amizades que dão visibilidade ao que se escreve.

    Neste caso do Irão, o que capta a atenção é a emoção das manifestações, aquelas imagens de Neda Agha-Soltan a morrer, os bons e os maus e há só uma minoria a querer perceber em que consiste o todo da disputa política que ali se passou a travar depois do anúncio dos resultados.

    Porque não haja dúvidas, ali os regimes caem na rua, não nas urnas de voto, lembrem-se do Xá, há 30 anos...

    E, já agora, repegando uma analogia que fiz num poste anterior, foi o que NÃO aconteceu em Portugal depois de Junho de 1958...

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  5. Extraordinariamente esclarecedor. De resto como é já hábito.
    Depois de lido o teu post um montão de coisas algo difusas e menos compreensíveis passaram a ter sentido.

    Já agora um galhardete.
    Também para mim és, em termos de conhecimento da História, O Blog de referência.

    Mai'nada!

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  6. Oportuno como é habitual.
    A dimensão das percentagens eleitorais das sucessivas maiorias confunde(-nos) muito menos, do que o impacto das "pedradas" que todas elas arremessam...

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