16 outubro 2008

AS ESPINGARDAS DOS ÚLTIMOS DEFENSORES DO REICH

Convém explicar previamente como, até ao final da Segunda Guerra Mundial, nunca houve qualquer tentativa entre países aliados para que houvesse uma normalização do calibre das munições que fossem utilizadas pelas armas dos seus exércitos. Muito pelo contrário, e exemplificando mais especificamente com as armas individuais de infantaria (as espingardas), até acontecia que quase todos os países europeus com pretensões faziam questão de produzir a sua própria arma operando a sua munição específica, que era incompatível com uma outra arma qualquer.
Diga-se, entretanto, que o que acontecia a países menos pretensiosos, como era o caso de Portugal, ainda era mais paradoxal. As suas unidades de infantaria chegavam a operar simultaneamente com armas de calibres diferentes, como eram os casos da espingarda Lee-Enfield de calibre .303 (acima), cedidas pelos britânicos por ocasião da Primeira Guerra Mundial e da Mauser Vergueiro (abaixo) de calibre 6,5 mm, que haviam sido compradas previamente (em tempo de paz, em 1904) aos alemães para equipar o exército português. Uma complicação em termos de instrução e logística.
Voltando ao assunto que interessa, nos primeiros meses de 1945, ao aproximar-se a queda do III Reich, este, mesmo assim, empenhou-se em bater-se até às suas últimas forças. Com a maioria da sua população masculina adulta já mobilizada na Wehrmacht (Forças Armadas) e perante a invasão simultânea por Leste (soviéticos) e Oeste (Anglo-Americanos) fez-se apelo à Volkssturm (Milícia Popular - veja-se abaixo), organização dependente do NSDAP (Partido Nacional Socialista) e que agregava todos os alemães dos 16 aos 60 anos que estivessem em condições de combater.
Há um contraste marcante ente o cartaz de propaganda acima e a realidade do desfile fotografado abaixo… A Alemanha estava nas últimas, tudo o que a sua indústria de guerra produzia debaixo dos bombardeamentos constantes dos aliados destinava-se à Wehrmacht e dificilmente se encontravam meios adicionais para equipar estes novas formações de soldados onde avô e neto se encontravam ombro a ombro. Até que alguém se lembrou de ir recuperar os despojos que haviam sido adquiridos naquela outra época (como ela agora parecia longínqua!) das vitórias alemãs na Europa.
Nos depósitos de Berlim, encontrou-se armamento de quase todas as origens: italiano, soviético, francês, checo, belga, holandês, norueguês, grego, britânico e polaco. Havia 15 tipos diferentes de espingardas e 10 modelos distintos de metralhadora. O problema, já adivinharam, eram as munições... Os mais bem apetrechados foram os que receberam espingardas italianas, pois havia uma disponibilidade de 20 balas para cada uma. Depois descobriu-se que as espingardas belgas podiam usar as balas checas mas, em contrapartida, as munições belgas não serviam nas espingardas checas…
Por algum motivo agora esquecido os alemães haviam capturado pouquíssimas espingardas gregas mas, em contrapartida, havia uma descomunal quantidade de munições para elas. A solução encontrada para tanta fartura foi arranjar processos metalomecânicos para que estas últimas fossem rectificadas para poderem ser disparadas das outras espingardas. No dia em que os soviéticos passaram ao ataque, cada elemento da Volkssturm que estava armado de uma espingarda tinha, em média, 5 balas para utilizar. Triste espectáculo de penúria de um Reich moribundo…

5 comentários:

  1. Fiquei a saber agora que a Alemanha não perdeu a guerra apenas por estar naquela posição por todos conhecida.
    Havia também um problema de gestão de stocks...

    ResponderEliminar
  2. Aquilo não eram stocks, JRD, eram saques...

    ResponderEliminar
  3. A Mauser distribuída no meu tempo
    de recruta na EPI em Mafra,tinha
    o calibre 7,9,tal como todas as
    outras que encontrei na Guiné
    distribuídas à população.Ainda
    em 2005 encontrei um caçador numa
    tabanca que possuía uma destas
    armas,tendo contudo alguma dificuldade em arranjar munições.
    Existiu alguma Mauser com calibre
    6,5 ou trata-se de uma gralha?

    ResponderEliminar
  4. Não houve gralha, trata-se mesmo de espingardas Mauser que disparavam uma munição 6,5 mm x 58 mm, conforme se explica na ligação para a Wikipedia que coloquei "em cima" da designação Mauser Vergueiro, mas que aqui posso desenvolver um pouco.

    Ao referir-me à confusão de armas em uso no Exército português, estava a referir-me ao período entre guerras (1918-39) especialmente aos anos 20 e principios da década de 30.

    Em 1939, quando começou a Segunda Guerra Mundial, já o Exército Português acabara com a confusão das armas e calibres multiplos e adoptara a Mauser 98k, idêntica à usada então pelo Exército alemão, e que o Paulo e eu conhecemos - calibre 7,92 mm (7,92 mm x 57 mm), simplificada na instrução para 7,9.

    Muitas Mauser Vergueiro foram depois modificadas para esta nova munição, que passou a ser a de referência para a arma de infantaria, até ao aparecimento da "popularíssima" G-3 e da munição 7,62 (7,62 mm x 51 mm - standard NATO). Muitas dessas armas assim transformadas foram depois distribuídas à GNR, a Guarda Fiscal ou à Legião Portuguesa.

    A Mauser Vergueiro e a Mauser 98k, mesmo quando a primeira foi transformada para usar munição 7,92, são facilmente distinguíveis entre si pelo formato da pega da culatra que é preciso manobrar cada vez que se coloca uma bala na câmara: ela é direita na Mauser Vergueiro e encurvada para baixo no caso da 98k que suponho tenha sido a arma que o Paulo conheceu.
    Estarei certo?

    ResponderEliminar
  5. Agradeço aexplicação,não conhecia
    essa Mauser Vergueiro,mas agora sei
    que já vi algumas por causa do
    manobrador da culatra,ou na mão de
    algum GNR,ou na mão de algum africano na Guiné.A que usei em
    Mafra tinha o manobrador curvado
    para a direita como diz.Continuo a
    aprender

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.