30 dezembro 2007

A «COESÃO» PAQUISTANESA

De uma forma assaz simplificada, podem existir duas formas de funcionamento de estados multinacionais, conforme seja a distribuição relativa interna das nacionalidades. Há um modelo maioritário, como acontecia com o Império Russo e depois com a União Soviética, onde uma das nacionalidades (nesse caso, a russa) constituía mais de metade da população. E há um modelo minoritário, onde nenhuma nacionalidade tem a capacidade de gerir o estado sozinha, tendo que se fazer uma espécie de coligação entre nacionalidades. O exemplo mais típico deste segundo caso foi o Império Austro-húngaro.
Os exemplos históricos apontados mostram como qualquer dos dois modelos pode ser funcional. Os exemplos de estados multinacionais intrinsecamente mais frágeis resultam de distribuições onde, ao contrário do modelo minoritário, as nacionalidades não estão suficientemente pulverizadas para as forçar a coligarem-se com outras, nem existe uma concentração suficiente de uma delas, como no modelo maioritário, que a torne a líder indisputada do estado multinacional. Por muito simplificada que seja esta análise, reconheça-se que ela se aplicava ao caso da Jugoslávia e agora aplica-se ao caso do Paquistão.
Como acontecia com os sérvios, entre a população paquistanesa os punjabis são o maior grupo nacional e quase metade da população (44%). Mas, assim como na Jugoslávia, o Marechal Tito era croata, também no Paquistão o General Musharraf é mohajir e o projecto da recém-assassinada Benazir Bhutto (que era sindi), envolvia a formação de uma ampla coligação eleitoral que permitisse derrotar a Liga Muçulmana Paquistanesa de Nawaz Sharif, cujo bastião é, precisamente, o Punjab. Mas a situação das nacionalidades paquistanesas é, se possível, ainda mais complexa do que a que se apresentava na Jugoslávia…
É que algumas das nacionalidades paquistanesas transbordam as suas fronteiras para os países vizinhos. Assim há baluches em número significativo no Paquistão Ocidental e também no Irão Oriental e tem sido repetidamente referido, a propósito da guerra levada a cabo contra os talibans, a coexistência de pashtuns (a nacionalidade predominante no seu recrutamento) tanto no Afeganistão, como no Paquistão. O que é muito menos conhecido é que também a nacionalidade punjabi se distribui pelo Paquistão e pela Índia*. Aliás, curiosamente, o primeiro-ministro indiano actual, Manmohan Singh, também é um punjabi…

Curiosamente, em qualquer dos três casos apontados acima (baluches, pashtuns e punjabis), a proporção entre os nacionais paquistaneses e os do país vizinho é sensivelmente a mesma: 2 paquistaneses para 1 estrangeiro. A escala dos seus efectivos é que é completamente distinta, dado que há aproximadamente 100 milhões de punjabis, 40 milhões de pashtuns e apenas 10 milhões de baluches. Decididamente, pensando nos antecedentes jugoslavos e nas suas sequelas, algumas delas ainda agora longe da resolução (como é o caso do Kosovo), pensar na evolução da situação paquistanesa só pode ser causa de apreensão…

* Uma das famílias do filme indiano Casamento debaixo de Chuva (Monsoon Wedding) é de origem punjabi e, além do inglês e do hindi, alguns diálogos são travados nesse idioma.

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