18 setembro 2007

MARTIN MILAN

A evocação, desta vez, não é dirigida a um autor (chama-se Christian Godard, no caso) mas a uma personagem semi-desconhecida da BD, Martin Milan. Martin Milan é o herói de uma banda desenhada a meio caminho entre o traço figurativo e o realista, um piloto que ganha a sua vida como taxista do ar aos comandos do seu avião, baptizado de Velho Pelicano que, como se vê pela gravura abaixo, parece estar sempre em vias de se vir a desconjuntar no ar, para gozo dos seus colegas…
Mas por aqui se esgotam os elementos de comicidade primária à volta das aventuras de Martin Milan. Ao contrário das de Astérix, por exemplo, as histórias do piloto do Velho Pelicano não têm cenas de grandes pancadarias ou outras caricaturas óbvias que suscitem o entusiasmo infantil; provavelmente por isso, Martin Milan nunca pôde ser uma daquelas séries populares entre as audiências infantis e juvenis das revistas semanais de BD, como o Tintin (onde as conheci).
Porque, apesar da aparência do traço, Martin Milan é uma série de BD para adultos, onde nem sequer os laivos de humor são fáceis de compreender. Quem as conhece, sabe que as personagens centrais costumam ser pessoas socialmente disfuncionais (embora essa disfuncionalidade se exprima das mais diversas maneiras) que, por o serem, despertam a mais profunda simpatia (solidária?) do protagonista. E que, por causa do público a que se destinavam, as histórias também contêm uma moral e costumam acabar bem no fim.
Durante as aventuras, Martin Milan costuma funcionar mais como testemunha do que propriamente o catalisador da acção, e as personagens e situações imaginadas por Godard são de um estilo e qualidade ímpares: desde um emirato rico em água mas sem petróleo, rodeado de emiratos ricos em petróleo, mas sem água*, a um safari ao contrário, onde se trata de libertar na savana uma leoa criada em cativeiro** (acima), passando pela história de espionagem de uma nova espingarda (o betisooka - veja-se a prancha abaixo) que lança raios que transformam as pessoas em idiotas***.
Como o seu herói, Godard também é um sonhador desalinhado e as suas histórias têm a extensão do que ele quer contar: existem aventuras de Martin Milan em formato curto (5 a 7 pranchas) e outras mais extensas, as mais recentes no formato tradicional de 42 a 46 pranchas de álbum, mas também as há – incluindo duas das que citei – nos formatos ingratos de 12, 20 ou 30 pranchas… Resta esclarecer que uma boa parte das aventuras de Martin Milan encontram-se esgotadas, mesmo nas edições em língua original (francês)…

* O Emir dos Sete Beduínos (L'Emir aux Sept Bédouins), publicado na revista Tintin, entre o nº 18 e o nº 34 do 7º ano.
** Eglantine da minha Juventude (Eglantine de ma Jeunesse), idem, entre o nº 52 do 4º ano e o nº 9 do 5º ano.
*** A Emboscada (Destination Guet-Apens), idem, entre o nº 36 e o nº 50 do 5º ano.

1 comentário:

  1. Grande Martin Milan! Detentor de um coração mole sempre (mal) disfarçado :) Obrigado pelo refresco da memória.

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