26 novembro 2006

PIMENTA NA LÍNGUA DE CORREIA DE CAMPOS!



Vai para mais de dez anos, ainda Cavaco Silva chefiava o governo, houve um ministro que aproveitou uma pausa da Conferência para contar uma anedota engraçada, mas politicamente incorrecta. Longe de ser um Jerry Seinfeld, o ministro assassinou completamente a anedota, tirou-lhe a graça toda, e, quanto muito, deveria ter sido corrido de onde estava por falta de jeito sob uma saraivada de tomates – biológicos, que a pasta em questão era a do Ambiente.

O que me surpreendeu foi a desproporção que se seguiu entre o conteúdo do episódio e as suas consequências, com Duarte Lima a aparecer na televisão – na altura creio que era presidente do grupo parlamentar do PSD – com cara de buldogue mal disposto, um verdadeiro cão portanto, a protestar como o gesto era absolutamente inaceitável da parte de um ministro do governo do professor Cavaco Silva e como o duplamente infeliz Carlos Borrego tinha que se demitir.

Foi este episódio que acabou por matar qualquer crença que eu tivesse sobre a existência de uma regra lógica e deontológica que associasse, na vida política portuguesa, a dimensão da bronca cometida à necessidade da demissão posterior do titular que a comete. Borrego foi um verdadeiro pato em toda aquela história porque broncas e gafes de toda a espécie se seguiram sem que os seus autores fossem incomodados ou se pedisse sequer a sua demissão.

Há aqui na blogosfera quem peça demissões de ministros com uma regularidade mensal quase cronométrica. Outros que são muito mais moderados e por isso nos merecem mais atenção. Tudo isto quero associar às palavras proferidas recentemente por Correia de Campos (Os grupos privados [do sector da saúde] têm a sua política e pagam aos senhores jornalistas para porem notícias nos jornais e nas televisões), em mais um dos exemplos que ele não sabe estar calado.

É evidente – embora não costume ver isto destacado – que, de entre as duas pastas governamentais consideradas mais complicadas (a Educação e a Saúde), enquanto a oposição e os bloqueios às políticas do ministério dirigido por Maria de Lurdes Rodrigues são feitos talvez de uma mistura de 4/5 de militâncias pessoais e de 1/5 de interesses económicos, no caso do ministério dirigido por Correia de Campos o caso muda completamente de figura, lembremo-nos apenas dos interesses de laboratórios e farmácias ou dos interessados em explorar a medicina privada.

E também é evidente que, havendo dinheiro, há lóbis para defenderem e promoverem os interesses de quem lhes paga. E todos temos uma ideia, nem que seja aproximada, da forma como os lóbis funcionam… Agora, apesar disto tudo, há algo que se tem de explicar (por mais uma vez…) a Correia de Campos: que há afirmações que se podem e outras que não se podem fazer quando se está diante de câmaras de televisão e/ou com um microfone de rádio aberto.

Na televisão, a situação fiscal de Luís Filipe Vieira é transparente, a história da vida de Valentim Loureiro é impoluta – há ainda quem se lembre da gafe da campanha eleitoral de 95, quando chamou ao palco o próximo primeiro-ministro de Portugal? Guterres! Guterres! Gu… (era Fernando Nogueira que ele devia anunciar…) – e António Vitorino sempre foi uma pessoa muito estimada no PS. E ai de quem discorde! E ai deste ministro se continua a ser assim desbocado...

Mas também custa ouvir tanta indignação quando suspeitamos que aquilo que foi dito não deve ser de todo mentira e que se trata sobretudo e apenas, de uma falta de cortesia e de etiqueta. Porque disparates técnicos, lembro-me de os ter ouvido a uma antecessora e camarada de partido do actual ministro, Maria de Belém Roseira, quando tentava argumentar com uma jornalista (que embarcou na explicação…) que as dívidas totais do seu ministério eram apenas as vencidas e não o total, englobando vencidas e vincendas.

Ora sobre esse episódio – que não era para rir, antes para chorar, dada a ignorância técnica demonstrada pela ministra conjuntamente com a incapacidade da jornalista em a interrogar, corrigindo-a – não me lembro de ter visto quaisquer pedidos de demissão. E daí, também não me recordo de que a passagem da Maria de Belém pela pasta da Saúde tenha resultado em inflexões significativas no ministério – em consonância aliás, com a imagem que ficámos do chefe desse governo. Teria sido por isso que não valia a pena pedir a sua demissão?

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