11 outubro 2006

O CRISÂNTEMO

Por ocasião de um discurso de Jimmy Carter no Japão, quando ela era presidente dos Estados Unidos (1977-81), socorreu-se de uma metáfora bem ajustada ao gosto oriental, em que comparava os progressos realizados pela diplomacia nipónica naquela época à forma como um pato desliza pela água: extremamente eficiente mas absolutamente discreta.

Esse estilo tinha sido uma constante, quase se poderia dizer uma obsessão, da política externa japonesa durante todo o período da guerra-fria. E as alterações, provocadas pelo seu término, têm sido a compasso de um daqueles velhos anciãos carregados de sabedoria que costumam aparecer nos filmes de artes marciais.

Enquanto único país vítima das consequências do armamento nuclear, o Japão tem cultivado uma imagem – Hiroxima - que lhe permite despertar as simpatias mundiais, desviando, por antecipação, as atenções das acusações pelo seu comportamento durante a sua fase imperialista da primeira metade do século XX, quando ocupou a Formosa e a Coreia, invadiu a China, etc.

O crisântemo, enquanto flor nacional, tem sido o símbolo desta forma japonesa de estar da segunda metade do século XX e de expressar o seu softpower, e nunca o anglicismo foi empregue com tanta propriedade porque o softpower japonês é do mais soft (macio) que há. O que não quer dizer que, apesar da sua perfeição, ele seja genuíno à forma de ser da nação nipónica.

Após o fim da guerra-fria, a literatura de ficção norte-americana de grande circulação, falha dos desaparecidos soviéticos, tornaram a eleger também japoneses para inimigos de estimação, como aconteceu em Rising Sun de Michael Crichton (1992) ou Debt of Honour de Tom Clancy (1994). E a imagem dos nipónicos está a deixar de ser a do crisântemo para retornar à do Sol Nascente.

Não porque tenham deixado de ser cuidadosos. Deve ser o único país do mundo que subclassifica sistematicamente o poder militar dos seus vasos de guerra: as suas fragatas seriam considerados pequenos cruzadores em todas as outras marinha do mundo… Ninguém os mencionou ou parece ter dado por eles a propósito dos recentes acontecimentos em Timor e das potenciais disputas do seu petróleo, mas eles estavam lá!

Mas a capacidade de gozarem da protecção dos Estados Unidos parece estar a esgotar-se, como se percebeu claramente com a recente deflagração do engenho nuclear norte-coreano. Evidentemente que o Japão vai ter que articular cada vez mais os seus interesses com os da China. E evidentemente que a imagem de discrição lhe está a render cada vez menos dividendos. O crisântemo está a tornar-se uma recordação…

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