08 outubro 2006

AS INDEPENDÊNCIAS AO LONGO DO SÉCULO XX (1)


Se, por uma qualquer possibilidade técnica nos fosse possível viajar no tempo e voltar ao início do século XX, encontraríamos uma ordem internacional composta por cerca de 50 estados independentes. Actualmente esse número aproxima-se dos 200. Numa época, em que se confrontam duas grandes linhas de pensamento, uma que aposta na tendência para a progressiva diluição do poder dos estados no quadro de uma ordem supranacional, configurada nomeadamente numa organização como a ONU, e outra, muito mais céptica, afirmando que a ausência de recursos próprios, por parte dos organismos internacionais (a citada ONU, sobretudo), inviabilizará o desenvolvimento de políticas mundiais autónomas em relação às das grandes potências, o que conduzirá à prevalência das nações como os agentes principais do cenário mundial durante o século XXI, importa analisar as condições em que, ao longo do século passado, se assistiu a uma quadruplicação dos referidos agentes.

Voltando aos tempos do início do século XX, aquelas cinco dezenas de estados independentes distribuíam-se geograficamente da seguinte forma: cerca de vinte eram europeus, outros tantos eram americanos e apenas uma escassa dezena pertenciam à Ásia; quanto à África e à Oceânia, só mesmo o rigor nos obriga a assinalar a existência de dois países africanos independentes.
Os países europeus eram já aqueles que, hoje, estamos acostumados a ouvir falar; fossem de formação mais antiga (França, Dinamarca, Suécia e Portugal), intermédia (Espanha, Holanda, Reino Unido, Suíça e Rússia) ou mais recente (Alemanha, Itália, Grécia e Bélgica), eles eram os protagonistas, quer da evolução técnica, científica e económica, quer das relações internacionais à escala mundial, um estatuto que era reconhecido fora do continente apenas aos Estados Unidos.

Estes, com uns meros 120 anos de história independente, faziam figura de veteranos entre os cerca de vinte países americanos, onde não havia mais nenhum que houvesse completado um século de independência. Mas, mais do que o seu estatuto de veterano, era o seu desenvolvimento económico e demográfico que já lhes assegurava uma posição dominante incontestada no continente.

Na Ásia, a dezena de países sobreviventes às conquistas coloniais das potências europeias no século XIX, deviam-no mais aos equilíbrios estratégicos acordados por elas, neutralizando áreas de expansão (Pérsia ou Irão, Afeganistão, Tailândia e China), do que à sua própria capacidade de sobrevivência face ao poderio militar dos ocidentais. Como acontecia também em África (Etiópia e Libéria), a independência formal escondia, na maioria das vezes, formas mais ou menos encapotadas de tutela externa (ocidental). Com a notável excepção do Japão, os governos locais não eram muito mais do que marionetas de interesses exteriores.

Iniciado em 1901, com a independência da Austrália, e terminando com a única independência (até à data) do século XXI, a de Timor Leste, o período que decorre desde o início do século XX assistiu ao aparecimento de 134 países independentes, descontando alguns casos circunstanciais que, por causa disso, surgiram e desapareceram antes do findar do século – foram os casos da Alemanha Democrática ou do Vietname do Sul, por exemplo. Outros casos circunstanciais acabaram por perdurar, como acontece com as duas Coreias.

Os próprios exemplos do primeiro e do último país (a Austrália e Timor Leste, respectivamente) a alcançarem a independência no período indiciam que, por detrás de uma realidade de 134 novos países, existem vários subgrupos diferenciados pela forma, condições e conjuntura em que alcançaram esse estatuto. A evolução do pensamento político é um dos factores responsáveis por essa heterogeneidade. Outro, talvez não menos importante, é a própria heterogeneidade cultural e civilizacional das populações envolvidas; afinal, o conjunto das populações somadas daqueles 134 países representa um pouco menos de metade (47%) de toda a Humanidade actual.

4 comentários:

  1. Só uma pequena precisão - o Acto de União entre a Escócia e a Inglaterra data, salvo erro, de 1707.
    Nesse sentido, o Reino Unido é mais recente que a Confederação Helvética e que as Províncias Unidas (Holanda).

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  2. A observação do comentário tem toda a razão de ser o que torna obrigatoria uma rectificação.

    É o que dá fazermos as análises de uma forma viciadamente anglocêntrica - espero que os leitores escoceses (!) deste blogue não se tenham sentido melindrados...

    Pessoalmente, costumo referenciar a unificação britânica a 1603, data da união pessoal do trono dos dois reinos em Jaime I (VI). As vicissitudes históricas do século XVII (guerra civil, Cromwell..) já são atravessadas em conjunto pelos dois reinos.

    Obrigado, caro Anónimo e, permita-me a brincadeira, cumprimentos à pequena sereia...

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  3. Obrigado pela correcção. O Tartan Army agradece (viva a Escócia!!!).
    Os cumprimentos serão devidamente transmitidos à interessada.

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  4. Não fiz uma correcção, emiti apenas uma opinião. De jure a União data mesmo de 1707 e, quanto a Uniões pessoais, por algumas que funcionaram (como esta ou a da Áustria-Hungria) houve imensas outras que fracassaram; uma delas connosco...

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