28 agosto 2006

A PRÚSSIA SOVIÉTICA

Depois de se ter falado dos países árabes ricos, outra região de elevado potencial de conflito para o futuro, desta vez na Europa, situa-se no canto nordeste da Polónia, junto ao mar Báltico. Consulte-se um Atlas e ali, entalado entre a Polónia, a Lituânia e o mar encontraremos um enclave, designado por Oblast (distrito) de Kaliningrado, que pertence à Rússia mas da qual está separado por um milhar de quilómetros, por terra ou por mar.

Os acontecimentos que levaram ao aparecimento naquele local deste pequeno território russo (um milhão de habitantes, cerca de metade dos quais vive na capital Kaliningrado, numa área de 15.100 Km2) até são muito interessantes, mas a sua condição actual, é tão anacrónica quanto a sobrevivência de um dinossauro da época soviética, com a certeza de se vir a tornar numa permanente fonte de preocupações para o futuro, à qual se prefere não mexer por agora.

O território corresponde a cerca de metade do que fora a antiga Prússia Oriental, terra originalmente eslava, que foi colonizada e evangelizada pelos Ordem dos Cavaleiros Teutónicos a partir do Século XIII. A capital escolhida, recebeu o nome de Konigsberg, e depressa se tornou uma importante cidade comercial do Báltico, onde a maioria da sua população era, por origem ou assimilação, germânica. No campo, onde a sociedade estava muito mais estratificada, só a nobreza era dessa origem.

Fazendo inicialmente parte da Polónia, cujo Rei os cavaleiros reconheciam como seu soberano, os territórios foram-se libertando progressivamente do poder polaco até, no Século XVII, virem a pertencer a um dos príncipes alemães, o do Brandenburgo um estado no leste da Alemanha com a capital em Berlim. Um dos seus sucessores, Frederico, veio a coroar-se em 1701 em Konigsberg Rei da Prússia, dando origem ao nome do estado que estaria no centro da unificação alemã 170 anos depois.

A Prússia Oriental do início do Século XX é uma região profundamente germanizada, onde Konigsberg é a mais destacada cidade da Alemanha de Leste, cidade berço de Kant, com uma Universidade onde Euler ensinou e onde repousam os restos mortais de Bismarck. Na sequência da alteração das fronteiras depois da 1ª Guerra Mundial, quando se procurava dar um acesso ao mar à Polónia, um plebiscito feito na Prússia sobre o seu futuro registou 97,5% de votos favoráveis à continuação na Alemanha.

A alteração das fronteiras depois da 2ª Guerra Mundial já não se fez de forma democrática. As populações de origem alemã dos territórios que fossem destinados a pertencer a outros países foram simplesmente expulsas e substituídas por naturais desses países. Ao contrário do que acontece na Polónia, onde se descobre agora que existe uma população que se reclama de uma ancestralidade mista*, entre a população actual do Oblast de Kaliningrado é residual aquela cujos antepassados já ali habitassem em 1945.

A escolha de tornar o território dependente de Moscovo pode perceber-se na lógica de equilíbrios imperial soviética de pós-guerra. Não o atribuindo à Polónia (antiga soberana), dá-se a satisfação a esta de não o atribuir também à vizinha Lituânia (convertida em República da URSS e também antiga soberana), neutralizando-a por uma dependência da longínqua Moscovo. Naquela altura, a Alemanha não estava em condições de fazer valer os seus direitos.

Hoje, já não é bem assim, e existem três países membros da União Europeia (Alemanha, Polónia e Lituânia) que podem apresentar argumentos consistentes e convincentes quanto à sua recuperação daquele território no momento em que a questão se levantar. De certa forma, a presença russa tem sido conveniente como a válvula de escape de algo sob pressão. Mas a posse do Oblast é, para a Rússia, um activo que possivelmente rentabilizará melhor negociando-o do que mantendo-o. Só lhe falta escolher a altura.

*Encontram-se vários casos desses nas selecções desportivas alemães da actualidade: Miroslav Klose (futebol) ou Dirk Nowitzki (basquetebol).

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