03 julho 2006

VAE VICTIS!

Vae victis! é uma expressão latina que se poderá traduzir por Ai dos vencidos! realçando a circunstância dos vencidos estarem sempre à mercê dos vencedores. A curiosidade é que a expressão latina original é atribuída a um vencedor dirigindo-se aos romanos vencidos, que depois se encarregaram de lhe conferir popularidade.

O primeiro-ministro timorense deposto, Mari Alkatiri, é provavelmente culpado de crimes contra o estado mas qualquer sentença seria comutada pelo parlamento, segundo José Ramos Horta, que espera ser nomeado como seu substituto esta semana. Assim começa o artigo* do The Australian de 3 de Julho, relativo à situação timorense.

Mais adiante, no mesmo artigo, lê-se, citando Ramos Horta, que o antigo primeiro-ministro era culpado, de acordo com as provas disponíveis, de não ter travado o ministro Lobato, um dos principais ministros do seu gabinete, de andar a distribuir armas. Segundo o Procurador-geral Longuinhos Monteiro (na imagem) afirmou, o Dr. Alkatiri poderia vir a sofrer por isso uma pena de até 15 anos de prisão.

Eu prefiro encarar os problemas do Dr. Alkatiri e de Lobato no contexto de uma nova democracia, onde todos nós somos inexperientes a lidar com todos os problemas associados à construção nacional, continuou Ramos Horta. E rejeitou a sugestão que a Austrália se tenha envolvido na deposição de Alkatiri, embora reconhecendo que o seu envolvimento pudesse ter sido um pouco mais discreto.

Enfim, Horta reconheceu, com resignação, que a Austrália é um grande doador, que se prepara para duplicar a sua ajuda alimentar, enquanto o brigadeiro que comanda as forças armadas australianas estacionadas no país anuncia a instalação de mais de 60 campos nos arredores de Dili para onde os refugiados serão incentivados a mudarem-se.

Quanto ao futuro, Ramos Horta afirma não acreditar que alguém possa, nos próximos seis a nove meses, curar as feridas actuais e restaurar a confiança no governo, e por isso está disponível para servir o país para além de Maio de 2007. Como se vê, parece haver muita disponibilidade em Timor para sarar feridas, desde que seja Ramos Horta a sará-las a partir do poder.

E quanto às hipóteses de Ramos Horta vir a ocupar a presidência, lugar a que Xanana Gusmão tem anunciado não ter intenção de se recandidatar, se a (Fretilin) ou outros partidos quiserem realmente empurrar-me para a presidência, tenho que pensar, porque tenho as minhas dúvidas se serei mais útil como presidente ou como primeiro-ministro.

É evidente que Timor-Leste permanece um país atrasado, onde não há qualquer vestígio de uma opinião publica activa e consciente. Houvesse-a, e muitas destas proclamações e declarações de Ramos Horta teriam sido audivelmente rejeitadas por uma das facções dessa opinião publica, como deixas de peça de teatro, ainda por cima canhestras e muito mal representadas.

Ou talvez o sejam, mas não haja meios para exprimir essa rejeição. Se parte das declarações de Ramos Horta chegam a ser, quanto às intenções ocultas, de uma transparência medíocre, outras há que chegam a ser risíveis, como aquelas que pretendem mostrar a indulgência e a magnanimidade do titular deste novo poder pelas acusações formuladas a Alkatiri.

Confesso que, em tudo isto, me dá uma enorme vontade de levar o assunto definitivamente para a brincadeira, conforme parece fazer o Procurador-geral Longuinhos Monteiro, que tem pinta de ser um outro brincalhão, por todas as afirmações que tem vindo a produzir – e sobretudo pelas que tem vindo a omitir – ao longo de toda a crise.

Em Timor, para além da inspiração constitucional e da estrutura semi-presidencial de governo também nos critérios de selecção do perfil para Procurador-Geral também se inspiraram no exemplo português? Se sim, não foi boa ideia... É que em tempos de crise política, os procuradores, são como os chapéus de Vasco Santana - Há muitos, seu palerma!

Arranjando outro Procurador-geral, podemos especular se, tivesse este golpe falhado, estaríamos agora a ouvir Alkatiri a amnistiar Ramos Horta da condenação à morte por traição à pátria e conspiração com potência estrangeira para derrubar o governo? E era Xanana Gusmão que corria o risco de apanhar até 15 anos de cadeia por não se ter oposto a isso?

* De assinalar que este artigo sobre Timor-Leste foi classificado na página dos assuntos internacionais, contrariamente à prática que vinha a ser seguida pelo jornal.

1 comentário:

  1. Talvez, neste caso, se possa optar por uma tradução "à cábula de liceu"!
    "Vae victis" daria um "Vai à vida", o que, visto o custo da mesma, fica muito caro... para quem perde!

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