23 junho 2006

XANANA

Quando se trata de problemas internacionais os extremos situam-se normalmente entre os (maus) especialistas, para quem os problemas se revestem de uma complexidade de nó que nunca se acaba de desfazer, e o grande público, que os órgãos de comunicação social cativam com uma boa história que acaba sempre por ter os maus e os bons.

Como, na realidade, costuma haver maus e bons em todo o lado, se se der relevo aos maus de um lado, fica-se com a sensação que os bons devem estar do outro. Foi assim, por exemplo, que, enquanto a Jugoslávia se desfez, as culpas pertenceram quase exclusivamente aos sérvios. Mas as investigações feitas aos massacres identificaram muitos responsáveis sérvios, mas também de outros grupos, nomeadamente croatas.

Misture-se esta simplicidade de análise com algum sentimentalismo lusitano, quando o problema internacional se passa numa antiga colónia portuguesa sobre a qual se pense haver um sentimento de remorso pela forma como decorreu a descolonização e obtém-se um combinado único de sentimentos da opinião pública de um país sobre o que se passa noutro país. Deve ser tão único que julgo que deveríamos registar a patente.

Há uns 20 anos e em plena guerra-fria, só entre nós aconteceria envolvermo-nos nas vicissitudes da guerra civil angolana da forma como o fazíamos. Como Eduardo dos Santos e o MPLA era o outro lado, o dos russos e dos cubanos, então o nosso, o bom, era o de Savimbi e da Unita, que, mais fraquinho, era o que lutava na mata.

Foi preciso que a guerra-fria acabasse para que a diplomacia portuguesa mostrasse que não tinha um tratamento especialmente preferencial com nenhum dos lados do conflito angolano. E foi preciso um acordo, eleições e a renovação da guerra para ficar claramente percebido de que massa – idêntica - eram feitos os líderes dos dois lados daquele conflito. E este só acabou com a morte de um deles - Savimbi.

Foi no mesmo espírito simplificado e carregado de sentimentalismo, que se foi montando entre nós uma imagem da galeria de personagens de Timor. Com a particularidade dos maus serem de fora: os indonésios. E assim apareceram Ximenes Belo, o bispo, e Ramos Horta, os dois prémios Nobel, e Xanana Gusmão, o guerrilheiro aprisionado que espiava na prisão as penas do seu povo.

É evidente concluir que a imagem de qualquer deles junto da opinião pública portuguesa nunca mais será a mesma depois dos acontecimentos que se desenrolaram e continuam a desenrolar actualmente em Timor. E uma boa parte da responsabilidade disso não é dos protagonistas, mas nossa, que deles fizemos uma imagem idealizada.

Sendo Xanana um político numa disputa pelo poder, é natural que tenha montado a sua manobra (ou contra-manobra) contando com os apoios que lhe parecem mais válidos – aparentemente os australianos. Mas, para o fazer, houve um capital de simpatia indulgente que ele possuía aqui em Portugal que se desvaneceu e, atendendo ao precedente de Savimbi, sem se ter transferido para mais ninguém da cena política timorense.

Ou, comentando o assunto de uma forma mais corriqueira e correndo sempre o risco de me poder enganar redondamente, é muito improvável que tornemos a ver o boneco de Chalana Gusmão nos tempos mais próximos, no Contra-informação da RTP, a discursar: Poooovuuu de timoooor lorossaaaae…

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