26 março 2006

SAL

Embora também haja um conto de Andersen envolvendo as virtudes do sal, esta história que irei contar não terá o final feliz que costuma caracterizar os contos do grande escritor dinamarquês.

Passa-se numa mercearia, onde, a propósito de um assunto que não é relevante para a história, alguém precisa de acompanhar o merceeiro às traseiras, passando pelos armazéns da retaguarda. Atravessando um primeiro, repleto de sal até acima, chega-se a um segundo, também atestado de sal, até um terceiro, e os sacos de sal sempre presentes, ocorre sondar o merceeiro:

- O senhor aqui deve fartar-se de vender sal…
- Eu? Nem por isso… Agora o vendedor que me vende o sal a mim, nem imagina…

Segundo toda a doutrina económica, incluindo a dos tontinhos liberais do fundamentalismo antropomórfico do mercado, este merceeiro, porque não segue as suas regras, vai falir comercialmente. O problema, como uma grande quantidade de problemas por aí, é o que vai acontecer até lá. E o que farão, vendedor e comprador, no dia seguinte.

A frase mais caustica a respeito desses analistas do longo prazo pertence ao economista John Maynard Keynes, que afirmou que, no longo prazo, estaremos todos mortos. Sem menção de qualquer prazo, também posso assegurar que a minha chave fixa há-de sair no euromilhões e que Portugal há-de ser um projecto falhado…

Regressando à história do vendedor de sal de sucesso, ela costuma ser evocada como um alerta de que o sucesso comercial não pode ser um fim em si mesmo. A falta de um mecanismo de controlo pode levar a um período de prosperidade artificial que depois termina bruscamente.

Parece ter sido a nossa história dos últimos anos. Esperemos que não se repita.

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